Pouco antes da virada de 2013, o contribuinte foi lembrado de que a tabela do Imposto de Renda de Pessoa Física seria mais uma vez corrigida abaixo da inflação oficial, medida pelo IPCA. Nada menos que 4,5% contra 5,91%, segundo a divulgação do IBGE feita em 10 de janeiro. O resumo da ópera é que o cidadão que está longe do topo da pirâmide salarial sustenta a comédia de erros que se tornou a tributação brasileira.
O Sindifisco Nacional, como faz desde sempre, protesta e se indigna contra o reiterado ataque ao bolso do assalariado. Vejam a injustiça da situação: quem ganha R$ 1.787,77 já é descontado em 7,5% na fonte, condição que muitas vezes anula um reajuste de vencimentos entre os trabalhadores de mais baixa renda — ou mesmo uma melhoria proporcionada pelo salário mínimo. O desapontamento em ser tungado é proporcional à satisfação inicial de sentir uma folga maior no bolso.
Vimos insistindo que a defasagem de 61,42% na tabela do IRPF, ante a inflação oficial, apenas aprofunda a desigualdade social — o editorial de 6 de março do Correio lembrou isso. O Sindifisco coletou os dados de 1996 a 2013 e chegou a conclusões que em momento algum foram desmentidas pelas autoridades incumbidas de formular a política tributária. Uma das mais impressionantes: em 1996, o assalariado que recebia até nove salários mínimos (em valores de hoje, R$ 6.516) estava isento de descontar o IR na fonte; atualmente, o teto de isenção não alcança 2,5 mínimos (R$ 1.810).
Isso deixa claro que a recuperação do piso salarial vem sendo corroída pelo achatamento da faixa de isenção, ao longo desses 17 anos. Para homens públicos que fizeram da (justíssima) recuperação do mínimo uma bandeira eleitoral, é estranho que se calem ante a catástrofe.
Por acreditar que somente com o engajamento da sociedade se conseguem mudanças expressivas, o Sindifisco lançou, em maio passado, a campanha Imposto Justo. Uma das suas vertentes é exatamente uma proposta de recuperação da tabela do IRPF, já materializada no Projeto de Lei nº 6.094/13, em tramitação na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados. Para adesão popular, há o site www.impostojusto.org.br, no qual se podem obter cálculos e constatar maldades jogadas no colo do cidadão. (Tal como o fato de que, se fosse aplicada à tabela do IRPF a fórmula que propomos, o limite de isenção subiria para confortáveis R$ 2.754,95.)
“Ah, mas uma correção dessa magnitude provocaria queda na arrecadação federal” — dirão os “nervosinhos” (para lembrar expressão utilizada recentemente pelo ministro Guido Mantega) das finanças governamentais. De forma alguma. A suposta perda seria compensada pela taxação de lucros e dividendos obtidos por acionistas e empresários. Como o que o Sindifisco preconiza é justiça, não “justiçamento” fiscal, sugerimos quatro faixas de contribuição: quem fatura até R$ 60 mil/ano estaria isento; entre R$ 60 mil e R$ 120 mil/ano, 5%; de R$ 120 mil a R$ 240 mil/ano, 10%; acima de R$ 240 mil/ano, 15%. (Lembremos que a tributação de lucros e dividendos existia até 1996. Somente por conta da Lei nº 9.249/95 passaram a ser isentos. Quer dizer: não estamos inventando coisa alguma.)
Na Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) que impetrou no Supremo Tribunal Federal (STF), em 10 de março, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) aponta que o PL nº 6.094/13 é uma alternativa concreta para a recomposição da tabela do IRPF. A Adin reforça uma posição clara do Sindifisco Nacional: não se pode mais permitir (e aceitar, e calar) que a carga das contribuições seja aumentada ano a ano com base no bem-estar das famílias, reduzindo-lhes a capacidade de consumir ou de poupar.
Ou você realmente acredita que o assalariado que é descontado na fonte em 7,5%, a partir de pouco mais de R$ 1,7 mil, consegue guardar algum dinheiro para o futuro? Ou consumir sem trocas como “sai o lazer, entra a reforma da casa”? O máximo que o trabalhador consegue é a sensação de que melhorias salariais não valem a pena.
Fonte: Correio Braziliense – DF